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segunda-feira, 14 de setembro de 2020

CoViD em Floripa - Atualização

 Por Almir M. Quites (atualizado em 14/09/2020)




Apresento  dados e previsões atualizados sobre a CoViD-19 em Florianópolis e mostro como a forma com que os dados são apresentados pela Prefeitura municipal dificultam a análise e a previsão da evolução da doença. Conduzem a interpretações equivocadas!

Você já percebeu que, no gráfico de casos confirmados de Floripa, a curva anda para a lateral, anda de lado? Observe! 

A Prefeitura de Floripa disponibiliza os dados aqui: CoViD Pmf . Todo o cidadão deveria ter acesso aos dados para fazer sua própria análise, mas faltam explicações didáticas para facilitar o leitor e não é fácil coletar os dados.

Analisei os dados e constatei que os gráficos dos casos confirmados e dos óbitos não estão corretos. Vou explicar o porquê!

Quando um caso da doença é notificado, ele deve ser registrado como caso notificado e depois vai para análise médica, para verificar se é mesmo caso de CoViD-19. Se a análise confirmar isto, então, o caso é registrado como caso oficialmente confirmadoEntre estes dois registros decorre um tempo que pode ser de dias ou mesmo meses, depende dos procedimentos burocráticos e técnicos. 

Com o conjunto de dados registrados, pode-se fazer gráficos para visualizá-los em conjunto. 

Dois tipos de gráficos muito parecidos são os mostrados na figura abaixo (figura 1 e figura 2). As curvas destes dois gráficos são as mesmas. Em ambos, as curvas roxas (curvas da notificação) são exatamente iguais.  Da mesma forma, em ambos os gráficos, as curvas vermelhas (curvas da confirmação) também são exatamente iguais. O eixo vertical (eixo das ordenadas) também é o mesmo. Trata-se da escala dos números totais (número acumulado) de casos da doença. O eixo horizontal (eixo das abcissas) também é o mesmo. Trata-se da escala do tempo, medido em dias, desde a ocorrência do primeiro caso da doença em Floripa. 


Então qual é a diferença

Observe bem a figura! No dia em que os dois gráficos são traçados, ambos são iguais, mas no dia seguinte a curva de casos confirmados da figura 1 já começa a se deslocar para cima, como mostram as setas.  O motivo está no eixo horizontal. Na figura 1, todos os casos notificados e confirmados foram registrados no dia da notificaçãoNa figura 2, todos os casos notificados e confirmados foram registrados no dia da confirmação.

Como o dia da notificação é anterior ao dia da confirmação, então, todas as confirmações da figura 1 são registradas num tempo passado. Já na figura 2todas as confirmações são registradas no tempo presente. Isto muda a essência dos dois gráficos. Na figura 1, os casos em análise, que estão estocados, aguardando confirmação, farão a diferença. Na medida em que cada um destes casos for confirmado e registrado em data passada (data da notificação), toda a curva que está em tempo posterior ao da sua notificação também se altera. Assim, com o tempo, toda a curva de confirmação da figura 1 se desloca para cima. Em outras palavras, a altura da curva no eixo vertical está subestimada.  O certo é:

Número de casos notificados ➧ Dia da notificação
Número de casos confirmados ➧ Dia da confirmação

A convenção internacional é que os dados dos casos confirmados sejam registrados no dia em que ocorreu a confirmação, e não no dia da notificação, que é data anterior, passada. Só assim se pode fazer projeções para o futuro. Só assim se pode comparar a evolução da CoViD-19 de diferentes cidades ou países.

Florianópolis não segue o padrão internacional (padrão da OMS). Não sei dizer se isto também é assim em todos os municípios do Estado de Santa Catarina! 

A seguir, isto ficará mais claro, porque mostrarei o que foi exposto com os dados oficiais de Floripa.

No Brasil, não há uma padronização nacional. Logo, embora os gráficos apresentados pelo Ministério da Saúde pareçam seguir o padrão da figura 2 (o padrão internacional),  eles podem estar subestimados devidos à soma dos dados que provém de cidades que fazem o registro como no gráfico da figura 1. Logo, tudo pode estar bem bagunçado.  

Tudo o que foi discutido aqui vale não só para os gráficos relativos ao número de casos da doença, mas também para os gráficos referentes ao número de óbitos. 

Diariamente a Prefeitura Municipal de Florianópolis atualiza retroativamente os números de casos confirmados (números dos dias passados). Logo, os dados de Floripa são instáveis e não servem para que se faça projeções para a previsão do futuro! Ocorre que os novos casos confirmados são registrados no dia da notificação, logo, em algum dia do passado, o que altera toda a curva a partir daí (Repito: este não é o padrão usado pela OMS). Assim, todos os dados do presente estão subnotificados em relação à data atual. Por isso, toda a projeção que se faça com estes dados estará subestimada. Além disso, os dados de Floripa não são comparáveis com os de outras cidades, ainda que estas adotem esta mesma metodologia. 

As curvas epidemiológicas mostram a evolução da doença com o tempo. Nestas curvas, o registro de novos casos de pessoas contaminadas pela doença ou de óbitos, devem ser registrados no dia da confirmação oficial, não no dia da notificação. Estas curvas crescem ao longo do tempo pelo acréscimo de dados confirmados a cada novo dia, não pelo deslocamento dos seus pontos já registrados.

Os dados que a Prefeitura de Floripa já publicou variam todos os dias. O passado se altera!  Quanto mais recentes, mais subestimados estão. Em outras palavras, a aclividade da curva de evolução temporal do número de casos confirmados fica menor que a real.

Veja neste gráfico: 
  
 

No dia 19/07/2020, anotei o número total acumulado de casos confirmados, o qual era 4048. A curva completa era a representada pelas bolinhas azuis (na figura acima)  Hoje, verifiquei que o mesmo dado (de 19/07/2020) passou a ser 4951. De lá para cá, 903 novos casos foram lançados naquele dia. Observando atentamente a figura acima, percebe-se que todas a bolinhas azuis (
referentes à 19/07/2020) subiram ao mudar para bolinhas vermelhas (referentes à 14/09/2020). Quanto mais recentes, mais subestimados os dados estão! A revisão diária do passado segue por semanas a fio.  

Esta metodologia de registro sempre faz parecer que já se está chegando no patamar superior da curva exponencial em "S", mas este está subestimado.

Esta prática conduz à subestimação dos riscos.

Os casos em análise, quando confirmados, deveriam ser registrados na data da confirmação e não na data da notificação.

A metodologia da Prefeitura deve ter suas razões, mas certamente não segue a padronização internacional. Gostaria de saber quais foram as razões para proceder assim. Por que a curva epidemiológica deve ser feita pelo dia da notificação e não pelo dia da confirmação do caso?

Se a Prefeitura quiser manter esta metodologia, pelo menos deveria:
1) deixar muito claro no seu "site" que aqueles números de casos confirmados são retroativamente mutáveis, por serem alocados diariamente na data da notificação;
2) disponibilizar também a evolução dos casos confirmados em função do dia da confirmação, desde o primeiro dia da CoviD ; e
3) disponibilizar a base de dados de modo que possa ser facilmente copiada pelos cidadãos com um simples "Crtl C". Assim os cidadãos de Floripa poderiam usar estes dados sem ter que copiá-los um por um para, então, fazer suas próprias análises.

A transparência é um dever do Estado em todos os seus níveis.

A forma dos diferentes municípios do Brasil contabilizar os casos da CoViD deveria ser nacionalmente padronizada e, acima de tudo, respeitar os padrões internacionais, para que os dados de todo o mundo sejam comparáveis.

Isto que a Prefeitura de Floripa faz parece ser o mesmo que o Ministério da Saúde quis fazer, após a última troca de ministros, e que gerou uma reação nacional. Estou certo?

Para fazer a previsão da evolução da CoViD em Floripa é preciso estimar o número total de casos que ainda serão confirmados e registrados até a data de hoje. Isto introduz uma nova causa de imprecisão. 
 
Até hoje, aqui em Floripa, temos 11737 casos e 126 óbitos oficialmente confirmados. Como temos, ainda em análise, 7371 casos, o número oficial real de hoje é de fato maior, mas o dado de hoje só será alterado no futuro. Supondo que cerca de 1/4 dos casos em análise agora venham a ser confirmados no futuro, para registro na data de hoje ou anterior, então o número oficial real de casos da CoViD, hoje (repito), deve estar em torno de 13580, portanto muito maior do que o informado, 16% maior! Com esta consideração poderei fazer uma projeção para o futuro com um pouco mais de precisão (a ser quantificada no futuro).

Então, deixando de lado as queixas, passo a analisar os dados oficiais da nossa cidade mesmo sabendo que trabalho com esta incerteza. 

Observe o gráfico que segue. Nele temos, na régua horizontal (eixo das abcissas), o tempo, contado em dias a partir de 22 de fevereiro de 2020. Na régua vertical (eixo das ordenadas) temos o número de casos da doença oficialmente confirmados. Assim, a cada dia da régua horizontal temos um ponto da curva que representa o número total de casos confirmados até aquele dia.

Aqui está o gráfico citado, de hoje, dia 14/09.



Neste gráfico temos, em bolinhas vermelhas a curva com os dados publicados pela Prefeitura de Florianópolis no dia de hoje (14/09/2020. Em bolinhas azuis, a curva com os dados corrigidos  conforme o critério já explicado. A curva corrigida teve sua aclividade aumentada por conta da inclusão de casos passados que ainda estão em análise. A partir desta curva, por um procedimento matemático, foi determinada a curva em linha contínua, de cor roxa, que passa exatamente sob os pontos conhecidos e que, prolongada para o futuro, mostra-nos quando o contágio da CoViD-19, em Floripa, vai terminar e quantos casos totais teremos até o final. 

Observe o seguinte: 

A curva de cor roxa prevê que o patamar (platô) se situa em 14.400
casos confirmados. Este total será alcançado após o 250° dia desde a ocorrência do primeiro caso da doença em Floripa, portanto, no início do mês de dezembro. 

Para quem gosta de matemática, esta é equação da curva vermelha: 
n = 14300 / [1 + 2,2.(290/t - 1,012))4], 
onde n é o número de casos confirmados e t é o tempo em dias desde o primeiro caso. 

Pode acontecer que as correções retroativas que serão feitas pela Prefeitura exijam uma correção mais drástica do que eu fiz aqui e, assim, agravem estes números, apesar da correção que já foi feita. Tudo depende do estoque de casos "em análise". O fato é que os dados apresentados por ela dão uma falsa impressão, exageradamente otimista.  


Tudo indica que a nossa CoViD já está contornando a última curva do "S" e se dirige para a reta final (para o patamar). Contudo, não podemos relaxar os cuidados com ela. Não devíamos estar abrindo o comércio e o sistema de transportes, como estamos fazendo. E pode ser que segundas ondas originárias de outros municípios ou Estados ainda estejam por chegar!

O vírus se propaga por caminhos preferenciais (logo, bem diferente do processo válido para a chamada imunização de rebanho). Estes caminhos se esgotam quando a relação CLCA/CI, ou seja, a relação entre concentração local de contaminados ativos e a concentração de imunizados, cai a certo nível. Porém, quando o relaxamento das medidas de imobilização e isolamento social acontece, estes caminhos se desbloqueiam e os vírus voltam a circular. 

A única estratégia de defesa que temos é não deixar que os vírus passem de uma pessoa para a outra. Eles dependem disso para existir.

Se todos os brasileiros fizessem uma uma quarentena absoluta de 15 dias, o contágio seria interrompido e o vírus seria exterminado, porque ele só se reproduz dentro das pessoas. O vírus não dura mais que 5 horas no ar e não mais que 100 horas nas coisas. Em 15 dias, os contaminados, sintomáticos ou assintomáticas (ou com sintomas leves) se recuperam, ficam imunes e não mais retransmitem o vírus (embora ainda não se tenha certeza científica de quanto tempo dura esta imunidade). 

Duas ou três semanas seriam suficientes para ganharmos a guerra em pouco tempo. 

Foi o que a Itália fez na Lombardia, mesmo depois de estar numa situação muito grave. Uma quarentena rigorosíssima! Foi o que deu certo lá!

Apenas duas ou três semanas! A quarentena eliminaria o contágio geral, mas a vigilância sanitária, especialmente nas fronteiras, deveria continuar muito atenta para isolar possíveis novos casos. Não iríamos permitir o surgimento de uma nova onda de contaminação.

No entanto, o nosso povo não é capaz de se unir para enfrentar o inimigo, nem o governo colabora  para para que a população se conscientize.  

A quarentena rigorosa sacrifica a economia a curto prazo para salvá-la da devastação pelo vírus a longo prazo. 

Cuidem-se e cuidem dos outros! 

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