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sábado, 15 de agosto de 2020

Vexame sem fronteiras

 Por Almir M. Quites

O fiasco foi brasileiro. Meu primeiro contato com esta gafe foi assim... Sabe aquele mal-estar que a gente sente quando alguém comete uma gafe? Por exemplo, quando você  sente a vergonha que o calouro deveria estar sentindo quando desafina completamente perante o juri? Bem, no caso, não foram calouros. 

A primeira vez que comentei este caso foi no Facebook. Foi uma crítica assim, de passagem, que fiz ao Heraldo Pereira, apresentador do Jornal das Dez (Globo News). Critiquei o fato de, todos os dias, ele enfadonhamente saudar, com ênfase, o número de recuperados da CoViD-19, como se isto fosse muito mais importante do que o número acumulado de casos da doença e o de mortes. "Notícia positiva", repetia ele. Para mim, notícia sinistra, funesta e irrelevante, mas ele anunciava sorridente que a notícia era positiva!

Para surpresa e indignação minha, eu mesmo comecei a receber críticas por não mencionar o número de recuperados em meus artigos sobre a CoViD. Nestas críticas, perguntavam-me: "e os recuperados, não contam?

Sim, "recovered lives matter". Então, no dia 10 de julho deste ano, publiquei um texto no Facebook com este título:  

🌞💡"𝙍𝙚𝙘𝙤𝙫𝙚𝙧𝙚𝙙 𝙡𝙞𝙫𝙚𝙨 𝙢𝙖𝙩𝙩𝙚𝙧" 💡🌞

Vidas recuperadas importam! É óbvio! Recuperados se contam e se comemora em cada caso particular. Mas quando se trata do todo, de um país, é só isto: contam-se, mas não há o que comemorar! No caso da CoViD-19, não é isto que importa. A recuperação só existe quando há doentes e, neste caso, a cura é quase automática. Explico melhor a seguir.

Não há remédios contra a CoViD-19, mas, mesmo assim, todos os contaminados, que não morrem, curam-se por ação do seu próprio sistema imunológico.

Tudo o que temos que fazer é ajudar para dar mais tempo aos que estejam em estado grave para que possam se curar por meio de seu próprio sistema imunológico. 97% dos doentes se recuperam. Se o número de doentes cresce, o de recuperados também cresce, sem que nada tenha sido feito!

O que precisa ser feito é reduzir o número de mortes. Para isso, é preciso ter vagas em leitos de UTI. Para se ter leitos de UTI disponíveis, é preciso abaixar ou, pelo menos, não deixar aumentar a quantidade de casos diários da CoViD. Isto só pode ser feito pelo próprio povo. Por todos vocês! Não podemos deixar o Sistema de Saúde colapsar por excesso de demanda!

Para que o número diário de novos casos baixe ou, pelo menos, não aumente, é preciso evitar o contágio, evitar a doença.

Para evitar o contágio é preciso que todos fiquem em casa. Sair, só se for muito, mas muito mesmo, necessário! E... deve-se sempre manter a distância regulamentar entre as pessoas. E usar máscaras... e lavar as mãos e o rosto, com sabão e com muita frequência.

O que o apresentador da Globo News está fazendo diariamente, é desviar a atenção do que é relevante para o que é irrelevante, além de passar a impressão equivocada para o público de que o povo brasileiro não tem problemas com a CoViD, como se soubéssemos curar os pacientes. Isto não é verdade!

Agora passo a tratar do vexame internacional.

O trágico é que o comportamento do apresentador da Globo News é exatamente o mesmo comportamento do atual Ministro interino da Saúde. Em uma reunião internacional, como quem desconhece o princípio da transparência e também desconhece o objetivo do encontro, o ministro interino omitiu o número de mortes e o número de casos da CoVid-19 brasileira dos participantes da reunião, formada por representantes de governos estrangeiros e membros da Organização Mundial da Saúde (OMS). Foi um vexame!

Após o país superar 100 mil mortes em decorrência do novo coronavírus, o ministro interino, Eduardo Pazuello, afirmou, no dia 08/08, que "lamenta profundamente cada vida perdida na pandemia", mas exaltou o número de pacientes recuperados, como se fosse uma mérito do governo Bolsonaro. Ele alardeou que "o Ministério da Saúde permanece trabalhando 24 horas por dia em parceria com estados e municípios para garantir que não faltem recursos, leitos, medicamentos e apoio às equipes de saúde" e recomendou que “pessoas com sintomas da doença devem procurar atendimento imediato em uma Unidade Básica de Saúde". Até aqui, um pronunciamento inútil! Agora vem o pior.

O ministro interino acrescentou solenemente: “O Brasil ocupa o primeiro lugar no mundo em número de pacientes recuperados, registrando mais de dois milhões de brasileiros curados”, afirmou!!

Que confusão mental! É o avesso do pódio em uma olimpíada na qual o vencedor é o pior! É claro que quanto mais doentes da CoViD um país tiver, maior será o número de recuperados! Em pouco mais de cinco meses após a primeira morte pela CoViD, o Brasil já superou a marca de 100 mil óbitos decorrentes da doença, o que significa que tivemos mais de 3 milhões de doentes! O Brasil tem cerca de 6,5% dos casos mundiais da CoViD e 7,2% dos mortos , embora o país abrigue apenas 2,7% da população do planeta.

Façamos a nossa parte. 

RESPEITE O ISOLAMENTO SOCIAL! Isto importa.

Ainda não é hora de relaxar o distanciamento social. Os prefeitos e governadores que estão fazendo isso estão errados. Voltar atrás e ordenar novamente o isolamento não compensa o estrago já feito, porque o contágio cresce exponencialmente! Cada novo contagiado dá início a uma nova série exponencial!

Repito: o que importa é não termos doentes. Para se ter um grande número de recuperados basta ter um grande números de doentes. Se o objetivo fosse aumentar o número de recuperados, teríamos que aumentar o número diário de novos doentes! Não é isto que se quer. O objetivo é evitar a doença.

O que se precisa esclarecer melhor é que estes recuperados ficam com sequelas de diversos tipos, de leves a graves, o que reduz a expectativa de vida. Se o povo soubesse disso, cuidaria mais de si e dos seus, criaria mais dificuldade para o vírus passar de uma pessoa para a outra.

Nota final: 
Os vírus só continuam existindo se, em poucos dias, conseguirem passar para outra pessoa e nela se reproduzirem. 15 dias de absoluto isolamento bastariam, mas todos (de uma mesma região) deveriam fazer o mesmo. 🤔 Pense nisso!

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