Por Almir Quites
Recebi este texto, escrito pelo jornalista J. Liberal, via e-mail de meu colega José João de Espíndola (UFSC) juntamente com alguns comentários seus. Por ser de grande importância, resolvi republicá-lo aqui.
Durante muitas décadas, presenciei apreensivo e angustiado, junto com colegas, o retrocesso da universidade, que, a cada dia, depreciava os valores acadêmicos e o próprio método científico, o qual exclui por completo as convicções não testáveis e não comprováveis e, além disso, exige que opiniões sejam claramente colocadas com ceticismo, como meras hipóteses que devem ser contestadas.
Há mais de 40 anos atrás, eu já sentia o aumento do descaso da universidade para com a Verdade e com o Método Científico. Na época, fui ativo defensor da introdução da disciplina de Metodologia Científica na fase inicial do currículo de todos os cursos. Até fui o presidente da comissão que fez a seleção dos primeiros professores e aí me desiludi, porque os candidatos entrevistados eram, em sua grande maioria, provenientes de cursos de Filosofia (até de Teologia) e claramente não compreendiam os postulados científicos, embora não suspeitassem disto. Tivemos que aprovar os melhores candidatos, ainda que não preenchessem os requisitos almejados, porque o ano letivo estava por começar e argumentava-se que com um curso interno, só para eles, seria possível prepará-los melhor para a sua missão. Nem esta iniciativa deu os resultados esperados!
A universidade, aos poucos foi sendo inundada de pseudociências. Esta fraqueza a tornou presa fácil dos políticos. Os partidos políticos passaram a ter influencia nas atividades fins da universidade e na escolha de seus dirigentes. As ideologias passaram a ser apresentadas como verdades absolutas, especialmente as de esquerda. O ensino foi amiúde transformado em doutrinação. O ceticismo e a contestação passaram a ser atacados com desprezo e por vezes com violência.
Este triste fenômeno aconteceu também no ensino secundário, o qual fornece à universidade alunos já fanatizados e portanto incapacitados para a vida acadêmica. Depois estendeu-se a todas as universidades. O emburrecimento da universidade brasileira foi uma consequência natural da irresponsabilidade de seus dirigentes. Este desnorteamento infestou os Três Poderes da República!
Leia, agora o artigo de J. Liberal e os comentários de José J. Espíndola, reproduzido logo abaixo.
Depois, leia o artigo de maio de 2016, sobre o mesmo tema, escrito por J. J. de Espíndola, aqui:
Recomendo também o artigo de março deste ano:
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Por J. Liberal #, Instituto Liberal, 29/06/2017
(Com três notinhas de rodapé de José João de Espíndola ##)
O notável emburrecimento causado pela sanha ideológica progressista por mais contraditório que seja, tem partido dos ambientes acadêmicos, ou seja, de áreas de produção e de disseminação do saber, em especial, do departamento de humanidades *. Como exemplo, evocou-se num “daqueles” seminários apresentados na turma de sociais, a situação precária do sistema prisional brasileiro, sobretudo o feminino. A ideia de que é preciso unir esforços para melhorar as condições sub-humanas e dar “dignidade às detentas”, sem dúvida pode e deve ser pensada com o intuito de não fazer com que o ambiente carcerário seja uma escola de aprimoramento da prática criminal.
Contudo, o que causa certo estranhamento é o fato de a academia brasileira estar quase toda fechada em relação a apenas tratar o efeito e não a causa dos problemas sociais contemporâneos, principalmente, quando se trata da garantia de direitos de contraventores, sejam eles quem for.
Gastam tanto tempo falando sobre as condições do sistema prisional brasileiro que, obviamente, são péssimas (se a saúde, a segurança e a educação no Brasil estão uma lástima, imagine como é a prisão da sua cidade?). Entretanto, esquecem-se dos motivos que têm levado bandidos à prisão. A lista é enorme: roubos, assassinatos, tráficos, corrupção, estupros, vandalismos, etc. Tal esquecimento se dá por suas mentes serem entorpecidas pelas ideias de “salvadores da humanidade” inculcadas por professores do ensino médio e superior. Ideias estas que, com uma roupagem de heroísmo, escondem em sua essência a busca pela legitimação de maus desejos e ações infames, típicas da natureza degradada do ser humano.
A neutralização da capacidade cognitiva por ideologias nefastas é tamanha que resulta no alheamento das vítimas que os bandidos(as) têm feito aos montes, deixando pais sem filhos, filhos sem pais e assim por diante. Este devaneio acadêmico, exemplificado na defesa e luta pelos direitos dos bandidos, poderia começar a ser repensado a partir de uma simples proposição que pouparia tempo, dinheiro e debates alienados: “não cometer crimes!” A fórmula mágica para cortar este mal pela raiz reside, simplesmente, no cumprimento de deveres como: não matar, não roubar, não estuprar, não violar o direito alheio, não depredar patrimônio público (a lista é grande).
Fica evidente que muitas questões sociais devem ser resolvidas de imediato, assim como há outras que devem ser resolvidas a médio e longo prazo. Dar o mínimo de dignidade a alguém que teve a privação da sua liberdade [com razão, é claro] pode ser um caminho para a obtenção dos tais “direitos humanos” [cá para nós, um dos assuntos preferidos da área de humanidades]. Entretanto, numa escala de prioridades, jamais conseguiremos avançar como nação enquanto atacarmos a superfície dos problemas e não os seus fundamentos. Jamais resolveremos os problemas sociais de nossa nação enquanto vivermos com a imagem invertida da realidade, assim como falou Marx ao se referir à religião[1]. Pena que, tanto ele quanto seus adeptos adotaram para si tal imagem invertida da realidade no que concerne às questões sociais.**
Igualmente, jamais escaparemos da violência institucionalizada[2] que a todo o momento espreita nossas famílias à medida que, nos ambientes de produção de conhecimento (escolas e universidades), a prioridade da discussão e da resolução dos problemas seja (como exposto acima) a condição do sistema prisional, ao invés das condições que levam os bandidos a cometerem crimes. Bandidos estes que, por sinal, não caíram de paraquedas no cárcere. Estão lá porque causaram danos e violaram os direitos de seus pares. Como então priorizar a garantia de direitos a bandidos que não se importam com o direito de suas vítimas?
Ainda sobre garantia de direitos, no filme O Jardim das Aflições, recentemente lançado no Brasil, Olavo de Carvalho comenta um trecho do livro L’Enracinement, de Simone Weil, que diz “um direito não é nada senão a obrigação de alguém mais”. A impressão que se tem dos apelos acadêmicos a favor de bandidos, encarcerados ou não, é a de que seus direitos devem ser garantidos ou ampliados à custa das obrigações de suas próprias vítimas. Uma insana inversão da realidade, do tipo: “o bandido tem o direito de roubar e a vítima a obrigação de ser roubada”. Ou ainda: “o direito do bandido parte da obrigação do Estado em detrimento do direito da vítima ou de seus familiares”. Mais do que direitos, uma sociedade deve se atentar aos seus deveres para mantença da boa civilidade, da ordem e do verdadeiro progresso.***
Diante disso, como não detectar um emburrecimento high level de professores e alunos, fruto de consciências entorpecidas pelo veneno ideológico “progressista” distribuído em doses cavalares na academia brasileira? Pois bem, acredite se quiser, este veneno é tomado com muito gosto por grande parte dos universitários de todo o Brasil simplesmente porque, no rótulo da embalagem, consta a seguinte dissimulação: “indicado para os defensores dos fracos e oprimidos”. Mal sabem eles que ao tomarem esta droga cumprem uma agenda globalista totalitarista que se resume no “quanto pior melhor”, privilegiando direitos e negando deveres, cuja finalidade nem de perto passa pela solução dos problemas sociais recorrentes em nossa nação.
E viva academia brasileira! Fábrica de “heróis descerebrados”!
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[1] Karl Marx em seu livro O Capital diz que a religião corresponde a um mundo nebuloso, onde os produtos do cérebro humano parecem dotados de vida própria, figuras autônomas, que mantém relações entre si e com os homens.
[2] Chamo de violência institucionalizada aquela que é incentivada, de forma sorrateira e branda, pelos meios de cultura (escolas e universidades) e organizações políticas, a fim de atingir ideais escusos de apoiados na revolução político cultural.
# J. Liberal é acadêmico e analista político.
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* ...departamento de humanidades...
Traduzindo para a UFSC: CFH, Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Mais especificamente ainda: Departamento de História.
** “Pena que, tanto ele quanto seus adeptos adotaram para si tal imagem invertida da realidade no que concerne às questões sociais.”
É emblemática a acusação, tantas vezes já lançada, de que é comum encontrar-se ardorosos defensores dos direitos humanos (dos bandidos) em funerais de marginais de todos os tipos, mormente traficantes de drogas. Mas jamais se viu um desses ‘defensores dos direitos humanos’ em enterro de policial morto (por marginais, traficantes de drogas) na luta pela defesa da sociedade que trabalha, paga impostos e cumpre a lei.
*** “Mais do que direitos, uma sociedade deve se atentar aos seus deveres para mantença da boa civilidade, da ordem e do verdadeiro progresso.”
Ou, lembrando J. F. Kennedy, “Nunca pergunte o que seu país pode fazer por você. Pergunte sempre o que você pode fazer pelo seu país.”
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## José J. de Espíndola é Engenheiro Mecânico pela UFRGS -- Mestre em Ciências em Engenharia pela PUC-Rio -- Doutor (Ph.D.) pela Universidade de Southampton, Inglaterra -- Doutor Honoris Causa da UFPR -- Membro Emérito do Comitê de Dinâmica da ABCM -- Detentor do Prêmio Engenharia Mecânica Brasileira da ABCM -- Detentor da Medalha de Reconhecimento por Ação Pioneira na Construção da Pós-graduação na UFSC -- Detentor da Medalha João David Ferreira Lima, concedida pela Câmara Municipal de Florianópolis -- Professor Titular da UFSC, Departamento de Engenharia Mecânica, aposentado.
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Presenciei uma reunião deste tipo há 30 anos atrás na UFSC, a minha universidade, onde trabalhei como professor durante toda a minha vida profissional, sempre em dedicação exclusiva. Cenas como estas doíam muito!
Almir Quites
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Parece que este cara, com suas perguntas, foi mais professor do que a maioria dos docentes que estes imaturos estudantes tiveram.
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