Páginas

sábado, 28 de março de 2020

Como refrear os danos da COVID-19

Por Almir M. Quites


A COVID-19 é realmente uma doença grave, não apenas apenas para os idosos, mas também para todos os que possuem doenças crônicas. Além disso, não é grave apenas pelo número de mortes que o vírus (Sars-Cov-2) provoca, mas principalmente porque sobrecarrega o sistema de saúde do país. Normalmente o que é divulgado é o número de mortes causadas pela COVID-19, mas deveriam mostrar também as mortes por todas outras causas, porque o colapso do sistema de saúde impede o atendimento de todos os outros casos, até mesmo de quem se acidente no trânsito. Muitas outras mortes virão como efeito colateral da COVID-19! E serão subnotificadas por muito tempo!


A finalidade desta publicação é mostrar aos leitores, de modo bem didático, como  acontece a difusão da doença Covid-19 causada pelo novo coronavírus, o Sars-Cov-2.

Serão abordados três casos:
  1. Caso em que não se tome medida alguma capaz de conter o contágio;
  2. caso se faça o que o presidente Jair Bolsonaro propôs;
  3. caso se se pratique o chamado "distanciamento social", que o Ministério da Saúde propôs.
Para isto, procurei na internet alguns artigos feitos em outros países com esta finalidade. Então decidi fazer este meu texto com base num deles, o artigo "Por que surtos como o coronavírus se espalham exponencialmente e como achatar a curva", de autoria de Harry Stevens, de 18 de março de 2020, publicado pelo respeitadíssimo Washington Post, o jornal diário norte-americano de maior circulação, fundado em 1877. (artigo citado: https://www.washingtonpost.com/graphics/2020/world/corona-simulator/)

A COVID -19 é uma doença nova, ainda  não suficientemente compreendida pela ciência. Cientistas de diversas áreas estão trabalhando para entender esta doença, inclusive matemáticos. 

A chamada curva exponencial, que tanto preocupa os especialistas, é do tipo sigmoide (forma do sigma grego ou da letra S) cuja equação mais simples é
 ,
onde e é a base dos logaritmos naturais; x0  é o valor de x no ponto médio da curva; L é o valor máximo da curva, e
k é a declividade da curva. (Nota: não vamos falar de matemática aqui, mas apenas explicar a sua importância para o caso). 


Existem outras funções exponenciais que descrevem uma sigmoide, as quais são muito usadas em todas as áreas da ciência, desde a minha área, a da metalurgia, até a sociologia, a psicologia e a epidemiologia, citadas apenas como exemplo. Também existem equações polimoniais que podem ser usadas com os mesmos objetivos. Existem também as funções que acoplam duas sigmoides, uma ascendente e outra descendente. 

Isto foi apenas uma introdução para explicar a utilidade da matemática no caso da COVID-19. A matemática ajuda, mas há questões difíceis na prática. Não temos dados confiáveis para incluir nas equações matemáticas. 

Vamos agora ao cerne da questão. 

No Brasil, o número de pessoas infectadas tem dobrado a cada dois ou três dias e a tendência ainda é crescente. Por enquanto, a matemática ajuda muito pouco para fazer previsões sobre o futuro, porque os dados não são confiáveis nem suficientes. Por exemplo, calculei a curva exponencial e calculei que, no pico da curva, teremos 20.000 infectados pala COVID-19. No entanto, sei que este número deve ser muito maior, porque os dados nos quais me embasei foram os publicados pelo Ministério da Saúde, os quais são muito inferiores aos reais, porque os dados são subnotificados e se referem apenas aos que apresentaram sintomas claros, não incluem os sintomas leves, nem os casos assintomáticos, sendo que todos eles espalham o virus. No Brasil, estima-se que, para cada caso, existam pelo menos outros 9 não diagnosticados.

Nos EUA, onde o número de testes é bem maior, a  curva exponencial preocupa os especialistas. Eles calculam que 
haverá cerca de 110000 de casos nos Estados Unidos até 20 de abril, quando o pico for atingido. No entanto, este número também está substimado.

Estas previsões também dependem das medidas de contenção da propagação do vírus que cada país venha a adotar, como também da sua eficácia. 

A matemática, neste caso, não serve para far previsões razoavelmente precisas, mas serve para simular a propagação do virus para podermos entender o processo e até visualizá-lo.  


Falo, aqui, de matemática, não de profecia. Pela matemática, até a probabilidade e o tamanho do possível erro são calculados. 

A disseminação pode ser retardada com algumas estratégias, como o "distanciamento social", se as pessoas e

bem concientizadas evitarem espaços públicos e limitarem seus movimentos em geral. Ainda assim, a COVID-19 continuará se espalhando exponencialmente por meses. 

Para entender o porquê e o como, mostro a seguir a propagação de uma de um vírus em uma população. Cada pessoa será representada por um pontinho colorido. Um software aplica movimentos aleatórios a estes pontinhos usando a matemática e gerando movimentos retilíneos aleatórios. Cada vez que um pontinho contaminado (ponto vermelho) se choca com um pontinho sadio (azul), este também fica contaminado. Algum tempo depois, os contaminados vão se recuperando e, por isso, o pontinho muda de cor, passam a ser roxos. Os pontinhos recuperados não contaminam mais os pontinhos sadios (azuis), nem se contaminam novamente ao se chocarem com um pontinho doente (vermelho).

Esta é uma simulação para que se possa ver o processo de contaminação ocorrendo.

Vamos chamar a doença simulada de ‘simulitis’ (
como no artigo do Washington Post) e o vírus que a propaga de "simulant" (por analogia). A ‘simulitis’ se espalha ainda mais facilmente do que a COVID-19, porque todo o contato propaga a doença.

Nesta simulação, não consideramos possíveis mutações do vírus. 

Primeiro caso: não se toma medida alguma para conter a propagação do vírus. 

Vamos ver o que acontece quando a simulitis se espalha em um lugarejo isolado com apenas 200 pessoas. 


Começaremos com todos os pontinhos do lugarejo em uma posição aleatória, movendo-se em direção e sentido aleatórios. No lugarejo uma só pessoa está infectada com o vírus "simulant". Lembrem-se, cada pontinho é uma pessoa! Se for vermelho, carrega o vírus, e o transmite para outros pontinhos que passam também a ser transmissores. 

Observe como a inclinação da curva vermelha, que representa o número de pessoas doentes (infectadas), aumenta rapidamente à medida que a doença se espalha e depois diminui à medida que as pessoas se recuperam (pontos roxos). Quanto mais pontinhos roxos, mais gente imunizada se terá e, portanto, a probabilidade de um pontinho vermelho se chocar num pontinho sadio diminui. Em outras palavras, o número de doentes para de crescer e depois começa a diminuir.  Veja!


Assim, você viu como ocorrem o crescimento da contaminação e o posterior crescimento da recuperação. 

O lugarejo simulado é pequeno. Logo, a "simulitis" se espalhou rapidamente por toda a população e todos se recuperam. 

Na verdade, no caso do COVID-19, haveria mortes. O número total de pontinhos no final seria menor e entre os recuperados haveria sequelas. 

Notem que o pico da curva é muito elevado. Logo o sistema de saúde entrará em colapso. Todos os doentes que não forem contaminados pela COVID-19 não terão atendimento e suas mortes se somarão àquelas da COVID-19.

Veja agora a curva de infecção com a dupla sigmoide:



Segundo caso: coloca-se em quarentena total apenas os velhinhos (conforme o Presidente falou).
 
Este é o caso que o presidente Jair Bolsonaro quer, para não prejudicar a economia do país, conforme expressou em pronunciamento na noite da terça-feira (24/03), em rede nacional de televisão.

Bolsonaro está influenciado por pessoas que não entendem nada do assunto e acreditam na tal "imunidade de rebanho", a qual seria alcançada quando cerca 80% das pessoas fossem infectadas e, por isso, teriam anticorpos contra a CoViD-19. No entanto, este tipo de imunidade não ocorre com a CoViD, porque o vírus desta doença evolui para dezenas de novas linhagens em pouco tempo e, assim, muda constantemente sua estratégia de contágio celular. É por isto que se diz que a CoViD não é facil de controlar e que ela virá em forma de diversas ondas. O sistema imunológico humano não consegue criar imunidade duradoura. Se esperarmos pela tal "imunidade de rebanho", a mortandade da população brasileira será enorme.

Bolsonaro não entende nada disto, mas segue os movimentos da Alt Right (direita alternativa) norteamericana. Aliás, houve países que tentaram adotar esta estratégia, mas já desistiram. Foram países que politizaram a questão da saúde ao invés de se basear na ciência. Por exemplo: EUA, Áustria, Filipinas, Hungria, Itália, Turquia e Austrália. Até a Inglaterra, cujo primeiro ministro é de esquerda, iniciou por esta estratégia, mas depois mudou. 

O que Bolsonaro está propondo, quando fala em colocar de quarentena apenas os velhinhos, é o tal de isolamento vertical, como é chamado no meio científico. Para o Presidente, somente o grupo de idosos devem permanecer confinado. O restante voltaria à vida normal. 

O médico americano David Katz, diretor do Centro de Pesquisa em Prevenção Yale-Griffin e um dos formuladores do método, diz que o isolamento vertical funciona como um “confronto cirúrgico bélico”. O ataque cirúrgico seria isolar o grupo de risco e concentrar nele os recursos de saúde para tratamento e prevenção. O restante da população ficaria desprotegida dos efeitos do vírus e desenvolveria a chamada “imunidade de rebanho”. Como já expliquei, isto não funciona com a CoViD-19!


É claro que é preferível frear a propagação do vírus antes que ele infecte grande parte da população, mas não como Jair Bolsonaro falou. Colocar os velhinhos sob quarentena não funciona na prática, porque é impossível isolá-los. Eles vivem com suas famílias e são muito dependentes deles, com raras exceções. 

Voltemos a nossa simulação. 


Para reduzir a propagação da simulitis, vamos tentar criar uma quarentena forçada similar a proposta por Jair Bolsonaro, só que muito, muito melhor. Não vamos confinar apenas os velhinhos, mas também, junto com eles, todos as pessoas que possuem doenças crônicas. Assim, poremos em total quarentena todos aqueles que estão na categoria de alto risco! E mais! Vamos supor que entre eles não haja nenhum infectado. 

No Brasil a soma de idosos e portadores de doenças crônicas chega a cerca de 100 milhões de pessoas, ou seja, aproximadamente metade da população. Por precaução, temos que considerar um pouco mais, porque há outros tipos de debilitados ainda que não sejam casos crônicos. Entqão, vamos ter que colocar de quarentena cerca de 2/3 da população do Brasil. Isto pode ser muito difícil na prática, mas no modelo matemático, isto é facil de fazer. Todos estes estarão no lado direito do retângulo que representa o lugarejo. E, mais ainda, vamos supor também que no 1/3 da população sadia (no lado esquerdo) só haja um pontinho (uma pessoa) infectado.

Acontece que nenhuma quarentena é perfeita. Elas não conseguem manter o isolamento com 100% de eficiência durante todo o tempo. A eficiência do isolamento, ainda que no início pudesse ter 100% de eficiência, vai se afrouxado com o tempo. Muitas pessoas trabalham e precisam encontrar outras pessoas, entregar objetos, alimentos, remédios, etc. Os familiares não conseguem deixar de se ver.  No mínimo, os suprimentos precisam circular. 

Veja o que acontece quando a eficiência do isolamento cai de 100% para cerca de 70%.

É impossível isolar completamente a população doente da saudável.


Esse tipos de bloqueio é muito raro e nunca é eficaz. Quando os primeiros contaminados (do lado esquerdo) passam paro o lado direito, encontram um ambiente só de sadios e a infecção se propaga muito rapidamente. 

Temos agora dois picos, o das pessoas em quarentena e o pico das demais pessoas. Note que agora são duas sigmoides duplas.  

Na verdade, no caso do COVID-19, também haveria mortes. O número de pontinhos do lugarejo, no final, seria menor e entre os recuperados haveria sequelas.

Notem também que o pico da curva é mais baixo do que no caso anterior. Logo o sistema de saúde tem mais possibilidade de não entrar em colapso. Se entrar em colapso, então todos os doentes que não foram contaminados pela COVID-19 não teriam atendimento e suas mortes se somariam àquelas do a COVID-19, inclusive as vítimas de traumatismos.


Terceiro caso: bloqueio pelo distanciamento social.

Felizmente, existem outras maneiras de retardar um surto. No caso de se aplicar o isolamento social, as autoridades de saúde encorajam as pessoas a evitar multidões, a ficar em casa o maior tempo possível e a manter distância de outras pessoas. Se as pessoas forem menos móveis e interagirem menos, o vírus tem menos oportunidades de se espalhar.

Mesmo assim, algumas pessoas irão sair. Talvez elas não possam ficar em casa por causa de seus trabalhos ou outras obrigações, ou talvez simplesmente se recusem a prestar atenção às advertências de saúde pública. Essas pessoas serão as mais propensas a adoecer e também serão as que mais espalharão o virus.

Vamos ver o que acontece quando 1/8 (um oitavo) da população continua a se movimentar, enquanto os outros 7/8 adotam uma estratégia que os especialistas em saúde chamam de “distanciamento social”.


Quanto maior a imobilidade social (distanciamento social), mais pessoas se mantém saudáveis. Se apenas uma pessoa em cada 4 se movesse, menos pessoas permaneceriam saudáveis.

Na prática, as pessoas devem se afastar de locais públicos. Os locais públicos são interditados. Reduzir as oportunidades das pessoas se reunirem aumenta a distância social das pessoas.

Na verdade, no caso do COVID-19, também haveria mortes e entre os recuperados haveria sequelas. O número de pontinhos do lugarejo, no final, seria menor.

Notem que o pico da curva foi o mais baixo dos três casos simulados. Logo o sistema de saúde tem mais possibilidade de não entrar em colapso. Se entrar em colapso, então todos os doentes que não foram contaminados pela COVID-19 também não teriam atendimento e suas mortes se somariam àquelas da COVID-19, inclusive as vítimas de traumatismos.

O distanciamento social é a estratégia mais fácil de implementar, a menos coercitiva, mas depende da consciência da população. As autoridades devem fazer campanhas de esclarecimento para que a população entenda a necessidade do distanciamento e imobilização. 

Conclusão

Você assistiu a três simulações:  
  • uma situação descontrolada, livre, de normalidade.
  • uma tentativa de quarentena
  • e uma de distanciamento social
Todos os movimentos dos pontinhos eram totalmente aleatórios. 

O distanciamento social, mesmo o moderado, supera a tentativa de quarentena e quanto maior for o distanciamento social melhor será o resultado. 


O nosso "Simulitis" não é a COVID-19, e essas simulações simplificam enormemente a complexidade da vida real. No entanto, assim como a "Simulitis" se espalha pelos pontinhos móveis da sua tela, a COVID-19 está se espalhando por nossas redes humanas, por nossos países, nossas cidades, nossos locais de trabalho, nossas famílias. E, como os pontinhos se chocando com outros na tela, o comportamento de uma única pessoa pode causar efeitos que afetam pessoas distantes.

Em um aspecto crucial, no entanto, essas simulações diferem da realidade: ao contrário da "Simulitis", a COVID-19 pode matar

Embora a taxa de mortalidade não seja conhecida com precisão, é claro que os membros idosos e todos os portadores de doenças crônicas da nossa comunidade correm alto risco de morrer. 

Logo, para que nossa simulação fosse mais realista, uma certa percentagem de pontos deveria desaparecer, simulando a morte.

Além disso, entre os recuperados haveria sequelas de diversos tipos, as quais ainda são desconhecidas. 

A estratégia do distanciamento social é a estratégia mais fácil de ser implementada, a menos coercitiva e também a que mais achata a curva da Infecção e, portanto, tem mais chance de evitar o colapso do sistema de saúde, mas isto depende da consciência da população. 

Para entender melhor a pandemia COVID-19, clique aqui: 
https://almirquites.blogspot.com/2020/03/covid-19-e-suas-consequencias.html

𝓐𝓵𝓶𝓲𝓻 𝓠𝓾𝓲𝓽𝓮𝓼

`°•○●□♢《  》♢□●○•°`

Para ler artigos sobre as urnas eletrônicas brasileiras, 

Para mais alguns artigos deste blogue ("weblog")
Clique sobre o título.

  1. Tudo se repete, repete... e se repete...
  2. Loki e o PIB
  3. A pandemia e a paranoia política
  4. Covid-19 ataca e presidente permanece no mundo ds lua
  5. Covid-19 e suas consequências
  6. Propaganda inescrupulosa
  7. O abraço do médico Dráuzio Varella
  8. Declaração capciosa do Presidente
  9. Bolsonaro copia Hugo Chávez?
  10. As ditaduras brasileiras e o monopólio da informação
  11. Desinformação e fantasia quântica
  12. O Princípio da Incerteza e o Professor Herbert Boor
___________________________________________________

Aviso sobre comentários 
Comentários contra e a favor são bem vindos, mesmo que ácidos, desde que não contenham agressões gratuitas, meros xingamentos, racismos e outras variantes que desqualificam qualquer debatedor. Fundamentem suas opiniões e sejam bem-vindos. Por favor, evite o anonimato! Escreva o seu nome no final do seu comentário.
Não use CAIXA ALTA, isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente.
Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
___________________________________________________

✓ COMPARTILHE ESTA POSTAGEM ✓
 Clique nos botões abaixo 

Nenhum comentário:

Postar um comentário