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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

ESCREVO, LOGO PENSO, PORTANTO ESTOU EM RISCO.

 Por Almir M. Quites

(Artigo que publiquei no meu Facebook em 17/02/2021)

Quando escrevo, penso, logo moldo minhas opiniões e isto é perigoso!

Parece-me que todos estão equivocados neste caso do tal deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ). 

Sei que muitos dos meus amigos são advogados. Como este texto implica em questões jurídicas, peço que me indiquem erros ou imprecisões que eu venha a cometer aqui.

A Polícia Federal prendeu o deputado Daniel na noite de terça-feira (16/2), em flagrante. O parlamentar divulgou um vídeo no qual faz apologia ao AI-5, o mais duro instrumento de repressão da ditadura militar, e defendeu o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) pela via inconstitucional.

O Ministro do STF, Alexandre de Moraes, utilizou uma lei criada pela ditadura militar brasileira (de 1964 a 1985) ao determinar a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), defensor da ditadura militar. Foi a Lei de Segurança Nacional, de 1983. 

Algo está muito errado! Numa democracia qualquer pessoa, mesmo sem ter a imunidade parlamentar, tem o direito de expor suas opiniões, por mais malucas que sejam, desde que não façam apologia ao crime. No entanto, o Ministro do STF puniu o deputado por crime de apologia da ditadura com base numa Lei da própria ditadura?! Algo está desafinado e não rima!😫 O pior é que a punição foi referendada por unanimidade pelo plenário do STF

A Lei de Segurança Nacional, que foi aplicada e endossada pelo STF, lei nº 7.170/83, foi redigida e sancionada no governo do General João Figueiredo. Ela determina os crimes que "lesam ou expõem a perigo de lesão a soberania nacional, o Estado de Direito ou chefes dos poderes executivo, legislativo ou judiciário". No caso do deputado Daniel, acusado agora, ele estaria expondo a perigo de lesão os chefes do poder judiciário. 

O fato é que esta lei é um entulho autoritário que permaneceu após a Constituição de 1988. Obviamente sempre vai causar conflitos e graves problemas. Pelo que me consta, esta lei (a LSN) não foi expressamente recepcionada pela Constituição de 1988. Logo, o deputado Daniel está sendo preso com base numa lei que permite cercear o direito de expressão. Isto é perigoso. No caso em foco, mais ainda, porque quem acusa são os mesmos que julgam! 

Considero este deputado, Daniel, uma pessoa desprezível, mas não posso concordar com o cerceamento à liberdade de expressão com base na antiga doutrina de Segurança Nacional. 

Fico pasmo ao ver que pessoas absolutamente despreparadas, como este Daniel Silveira, passam, do nada, a ser Deputado Federal. Se isto acontece, é porque nossa organização política não tem proteções adequadas contra a incompetência na administração pública, o que coloca a sociedade em risco. 

Sem dúvida, o deputado Daniel tem um passado desabonador para ocupar qualquer cargo público e não tem competência para assumir as altas responsabilidades de um representante do povo no Congresso Nacional. 

O que o deputado fez pelas redes sociais foi mesmo apologia do AI-5 e do fechamento do Supremo Tribunal Federal por meio incontitucional. Isto o próprio Presidente Jair Bolsonaro e seus filhos também fizeram e nada aconteceu! No entanto, em todos estes casos houve crime e todos deveriam ter sido punidos! Isto mostra que, na prática, os brasileiros não são iguais perante a Lei.

Não tenho dúvida alguma que Daniel Silveira praticou o crime de apologia e incitação ao crime, tal qual prevê o Codigo Penal

👉 Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime: 

👉 Pena - detenção, de 3 (três) a 6 (seis) meses, ou multa. 

Portanto, a Lei de Segurança Nacional era dispensável!

Sem dúvida, pelo Código Penal, a pena é leve. Por isso mesmo, há uma sensação de impunidade social nesse tipo de conduta, especialmente vulgarizado pelas redes sociais. Parece que o Ministro Alexandre de Morais preferiu a Lei de Segurança Nacional justamente para que a punição pudesse ser mais rigorosa!

O artigo 286 do Código Penal trata do incitamento intencional e público à prática de crime. A publicidade da ação é um pressuposto indispensável. Sem ela, tem-se apenas uma intenção impunível. O incitamento público implica na utilização de meios que sejam efetivamente capazes de levar o fato a um número indeterminado de pessoas (alto-falantes, cartazes, rádio, televisão, internet etc.). O fulcro criminoso, a meu ver, é a agressão à segurança jurídica. O bem jurídico tutelado é o Poder Público, não pessoas do governo.  

Não se trata apenas de emitir uma opinião. Em outras palavras, não é o direito de opinião que está em jogo, mas sim o objetivo de instigar a ação criminosa. Se a pessoa instigada a praticar um crime vier a efetivamente praticá-lo, o instigador poderá responder por ele, como coautor.  

O crime de incitação ao crime se consuma com a simples conduta, não há necessidade de um efeito concreto. 

É neste caso que se enquadra a conduta do Deputado Daniel Silveira. Ele cometeu o crime de incitacão ao crime previsto no Código Penal.

Abomine-se a Lei de Segurança Nacional (LSN)! Ela foi feita justamente para enquadrar opiniões como crime, principalmente as opiniões emitidas sob forte indignação, e para poder puní-las de modo muito mais duro. 

Por exemplo, eu, que afirmo que as "urnas eletrônicas" brasileiras são uma fraude, porque são passíveis de trapaça interna (feitas pelos donos das urnas) e, que, por isso, são inconstitucionais, eu poderia facilmente ser enquadrado nos artigos 26 e 31 da Lei de Segurança Nacional, este lixo autoritário! Poderiam simplesmente me acusar de espalhar "fake news"!

O artigo 31 da LSN autoriza a abertura do inquérito e o artigo 26 prevê pena de 1 a 4 anos de prisão “para quem caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação”. Quem decidiria se, de fato, haveria ofensa à reputação do governante ou se configura calúnia seriam os próprios poderosos do Estado, contra um simples cidadão, porque o processo correria no TSE e STF. Assim, o próprio acusador seria o juiz ou alguém muito próximo dele. Certamente, o réu seria um cidadão inexpressivo, como eu, tratado com desdém. 

A utilização da LSN para criminalizar opiniões ou mesmo incrementar a pena dos acusados em eventuais condenações, abre precedentes perigosos aos cidadãos que simplesmentes expressam suas indignações.

A Lei de Segurança Nacional (a LSN) é desnecessária diante do que já está consolidado no Código Penal brasileiro. 


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