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sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Banalização da improbidade

Almir Quites - 08/12/2016


Vivi alguns anos num país em que as profissões de maior prestígio eram a de professor e a de servidor público, em ambos os casos, em todos os seus níveis. Acostumado com a banalização da improbidade administrativa do Brasil, isto me surpreendia!


Para nós brasileiros até parece impossível que o funcionário público possa ser honrado e competente. 

O servidor público brasileiro tem muito má fama, mas não deveria ser assim, porque a legislação brasileira é rigorosa em relação a ele. 

A lei brasileira exige que, para para assumir um cargo público, o cidadão seja probo, idôneo e ilibado. Exige ainda, de qualquer servidor público, um padrão de comportamento moralmente adequado, mesmo fora do âmbito do exercício das funções correspondentes ao cargo, porque a vida privada do funcionário público têm repercussões e desdobramentos públicos. Portanto, o servidor público não pode afrontar, nem na vida privada, aqueles valores com os quais está comprometido no exercício do cargo público.

Esse entendimento encontra respaldo: 
a) nos artigos 5º, inciso LXXIII; artigo 14, parágrafo 9º e caput do parágrafo 4º da Constituição Federal; 
b) no artigo 22 da Lei Orgânica da AGU (Lei Complementar 73, de 1993); 
c) na segunda parte do artigo 148 da Lei 8.112, de 1990; 
d) nos artigos 1º, 3º, 4º e 11º da Lei 8.429, de 1992; e 
e) em significativas decisões judiciais, a exemplo do Recurso em Mandado de Segurança 17.354, julgado pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça e do Mandado de Segurança n° 11.035, julgado pela 3ª Turma do mesmo STJ.

Nos artigos mencionados acima, constata-se que o funcionário público está sujeito à instauração de procedimento administrativo disciplinar, ainda que o pretenso ato ilícito não tenha sido praticado no efetivo exercício da função pública. 

Para ser chefe do poder executivo federal, há mais uma exigência legal. Para o Presidente da República, a legislação brasileira exige também que ele não seja réu no Supremo Tribunal Federal (STF), se for, deve ser imediatamente afastado do cargo. 

É claro que, pelo princípio da igualdade entre os poderes da República, o que se espera, é que o mesmo seja exigido para os chefes dos dois outros poderes, ou seja, para o chefe do poder legislativo, o Presidente do Congresso, e para o chefe do poder judiciário, o Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Por que não? Afinal, o objetivo não é a moralidade pública? 

No entanto, ontem, para espanto geral, o próprio STF decidiu que, para presidir o Poder Legislativo, não há necessidade desta exigência. Em outras palavras, o Presidente do Congresso Nacional pode continuar no cargo, caso se torne réu, basta apenas que fique fora da linha sucessória da Presidência da República. Isto significa que, para ser chefe do poder executivo, o cidadão precisa ser probo, mas, para ser chefe do poder legislativo, não precisa. Logo, o STF cassou a igualdade entre os três poderes da República. Além disso, retirar o presidente do Senado da linha sucessória significa revogar o artigo n°80 da Constituição Federal.

Trata-se de erro crasso do STF. Vexatório! Onde jogaram o alardeado "notório saber" dos "doutos" ministros do STF? 

Assim, Renan Calheiros, Presidente do Congresso, mesmo sendo réu no STF em processo no qual responde por peculato (desvio de recursos públicos), não será afastado do seu cargo e não há a quem recorrer. Além deste processo, Renan Calheiros tem mais onze (11) outros processos aguardando o julgamento das denúncias pelo STF. Enquanto isso, vários crimes vão sendo gradativamente prescritos!  

Renan Calheiros, Presidente do Congresso por muitos anos, desde que renunciou ao primeiro mandato, em 2007 (para fugir da cassação de mandato pelo Conselho de Ética o Senado) apresenta um considerável rastro de atos suspeitos e não esclarecidos, que inclui o caso dos bois (inquérito criminal 2593,em andamento no Supremo Tribunal Federal) e também a denúncia apresentada pelo então Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, de ter desviado R$ 44,8 mil do Senado, por meio da chamada verba indenizatória.

Parece-me claro que Renan Calheiros não preenche os requisitos legais para ser funcionário público. Isto fica evidente até mesmo para quem apenas ouve seus cínicos pronunciamentos pela televisão. Como, então, permitiram que fosse candidato a Senador? Como chegou à Presidência do Congresso Nacional por duas vezes?

A resposta a estas perguntas pode ser apresentada de modo muito simples: é porque o sistema político e jurídico brasileiro está podre! As leis brasileiras não são cumpridas, nem mesmo pelo "Submisso Tribunal Federal" (STF). As instituições nacionais estão em frangalhos.

Os brasileiros não merecem os parlamentares, os ministros e o presidente que têm! Não me digam que a culpa foi do povo que os elegeu, porque o sistema político é desonesto e o eleitor é vítima dele!

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Nota:
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
Art. 80 -  Em caso de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal.



Notícia!
Acabou de acontecer na final de um campeonato de futebol: o juiz expulsou jogador de um time, ele se recusou a sair de campo e ingressou com recurso no STF da Justiça Desportiva. O Tribunal decidiu, há pouco, que o atleta pode ficar em campo, mas não pode fazer gol!
Coisas do futebol...


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