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sábado, 8 de junho de 2013

Modernização da falcatrua eleitoral

 Por Almir Quites

TRE diz que errou?! Errou nos boletins?
Não, o TRE fraudou a totalização dos votos!



Artigo de 2010, corrigido, baseado em postagem do autor na lista de discussões por e-mail da APUFSC (Associação os Professores da UFSC) em março de 2010.

 

A democracia é um bem a ser preservado a todo o custo. Trata-se de uma tarefa difícil e árdua, porque os ditadores juram que são democratas e chamam suas ditaduras de “democracia”. A história desta contenda constitui a História dos seres humanos, a qual será estudada detalhadamente no futuro.

O que vamos contar a seguir é parte da História recente dos brasileiros.

A palavra instituições significa o conjunto de regras e normas destinadas a satisfação dos interesses coletivos da nação. Por hipocrisia, os chamados Atos Institucionais da Ditadura Militar instalada em 1964 apenas defendiam a própria ditadura. O Ato institucional n°1 (conhecido como AI1) cassou os mandatos de políticos opositores e subordinou a Constituição de 1946 aos ditadores militares.

Desde o início da Ditadura Militar até 1979, as eleições brasileiras foram indiretas e balizadas pelo bipartidarismo. Os Presidentes eram “escolhidos” por "Colégios Eleitorais", após serem escolhidos dentro das Forças Armadas. Estas inclusive "sugeriam os candidatos de oposição", destinados a perder a eleição. O Colégio era composto pelo Congresso Nacional e por outros representantes dos governos estaduais, mas sempre organizado de modo a garantir a vitória do governo.

A partir de 1966, surgiram também os governadores e prefeitos "biônicos". Esta foi a palavra pela qual o povo apelidou aqueles governadores e prefeitos que não eram eleitos. Biônico significa algo cujo desempenho biológico é amplificado por meio da eletrônica e/ou da cibernética. No caso, significava, governadores e prefeitos escolhidos e amplificados pelo próprio governo militar.

O governo queria ter eleições cujo resultado fosse controlado por ele!  Para isso fazia qualquer trapaça.

Na eleição de 1976, o governo decretou a chamada "Lei Falcão", a qual estabelecia que, a propaganda dos candidatos, só poderia conter a foto e a voz de um locutor lendo o curriculum-vitae do candidato. 

Em 1977 houve outra trapaça. Criaram os senadores biônicos. 

Em 1982, quando a ditadura militar já estava em estado terminal, o governo militar ainda lutava para se manter no poder. Ele permitiu o retorno amplo das eleições para os governos estaduais, mas transformadas em eleições indiretas. Os governadores eram eleitos pelas Assembleias Estaduais, todas controladas pela ARENA, o partido do governo.

Mais uma trapaça, que estende seus efeitos até hoje, ocorreu em junho de 1982, quando a Lei nº 6.996, estabeleceu que os Tribunais Regionais Eleitorais, nos estados autorizados pelo Tribunal Superior Eleitoral, poderiam "utilizar processamento eletrônico de dados nos serviços eleitorais”. Esta Lei estabelecia: “o pedido de autorização poderá referir-se ao alistamento eleitoral, à votação e à apuração, ou apenas a uma dessas fases, em todo o Estado, em determinadas zonas eleitorais ou em partes destas”. Ou seja, a legislação deixou em aberto a definição do grau em que as fases de cadastramento do eleitor, votação e apuração seriam realizadas por intermédio do processo eletrônico, cabendo ao Tribunal Superior Eleitoral, discricionariamente, autorizar os Tribunais Regionais a informatizarem o processo eleitoral. A lei também permitiu aos Tribunais Regionais Eleitorais “executar os serviços de processamento eletrônico de dados diretamente ou mediante convênio ou contrato”. 

Naquela ocasião, os partidos políticos que manifestaram o desejo de acompanhar de perto todas as etapas da apuração e totalização eletrônica dos votos enfrentaram ameaças ostensivas da ditadura militar.

Nunca mais, até os dias de hoje, a apuração eleitoral pode ser fiscalizada. 

Naquele ano de 1982 disputaram o governo fluminense os candidatos Wellington Moreira Franco (PDS), Leonel Brizola (PDT), Miro Teixeira (PMDB), Sandra Cavalcanti (PTB) e Lysâneas Maciel (PT).

Autorizado pela legislação, o TRE-RJ deu início ao processo de cadastramento das empresas de processamento de dados com o propósito de abrir licitação do serviço de computação das eleições de 15 de novembro, quando estariam em disputa os cargos de governador do estado, senador, deputado federal, estadual, prefeitos dos municípios do interior e vereadores de todas as Câmaras Municipais do estado. No entanto, mais uma falcatrua estava armada.

Inscreveram-se na licitação as empresas: Serpro (ligada à administração pública federal), Datamec (controlada pela Caixa Econômica Federal) e a Proconsult (empresa criada no ano anterior pela fusão de três grupos empresariais). As duas primeiras desistiram logo da licitação, alegando não concordar com o Plano de Apuração elaborado pela Justiça Eleitoral, o que deixou escancarado o caminho para a Proconsult informatizar o processo de apuração dos votos.

As tensões então reinantes aumentaram, mostrando a efervescência que havia nos bastidores daquela apuração eleitoral, que seria feita com uma fase de totalização totalmente automatizada e sem possibilidade de fiscalização humana. 

A ditadura militar queria controlar o processo de abertura “lenta, gradual e segura”! Na verdade, esta última palavra significava que o candidato Moreira Franco, escolhido pelo governo, deveria ganhar. Para a ditadura, Leonel Brizola, político nascido nas hostes do ex-ditador Getúlio Vargas, e que, como governador do Rio Grande do Sul liderou a Campanha da Legalidade, impedindo o golpe militar de 1962, não apenas deveria perder, mas também deveria ser banido da política. 

As fraudes não se evidenciaram apenas no processo eletrônico de apuração, mas também na forte presença do aparato militar no controle do processo e na intimidação das iniciativas de fiscalização por parte dos partidos e da sociedade civil.

Durante a divulgação dos resultados parciais da apuração eleitoral, a TV Globo noticiava a vantagem de Moreira Franco, candidato do governo, enquanto a Rádio Jornal do Brasil apontava Brizola em primeiro lugar.

Em 20 de novembro, cinco dias após a votação, PDT, PMDB e PT pediram ao presidente da comissão apuradora do TRE-RJ uma auditoria técnica no trabalho da Proconsult, pois somente no dia 19 o total de votos nulos e em branco começou a constar dos boletins do Tribunal, mas com erros, segundo os delegados dos partidos.

Desconfiado, o PDT, de Leonel Brizola, havia feito uma apuração paralela. Como a contagem dos votos de cada urna ainda era manual, o PDT passou, então, a recolher os boletins de apuração e a enviá-los para pontos de digitação secretos. Os discos eram processados no Centro de Processamento de Dados da construtora Sérgio Dourado, na Rua Prudente de Morais, em Ipanema.

A Rádio Jornal do Brasil, logo após os primeiros dias de apuração, verificou que Brizola liderava na capital, onde estavam 70% dos votos, e decidiu se concentrar na apuração dos votos de Brizola e Moreira Franco. Graças a isto, a rádio e o jornal puderam perceber, antes dos resultados finais, as distorções que ocorriam nos números oficiais do TRE, repassados pelo Proconsult. Os editores do jornalismo da Rádio Jornal do Brasil, Pery Cotta e Procópio Mineiro, passaram também a fazer uma contagem própria de votos, usando a estrutura de suas empresas, e constataram que seus resultados confirmavam os do PDT. 

Ficou comprovado que, nos resultados divulgados pela Proconsult, votos nulos e em branco eram contabilizados pró Moreira Franco, modificando assim fraudulentamente o verdadeiro resultado das urnas. 

Os programas instalados nos computadores da empresa Proconsult, contratada pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio para o serviço, subtraíam uma determinada porcentagem de votos dados a Brizola transformando-os em votos nulos e transferiam sufrágios em branco para a conta do então candidato governista, Moreira Franco. "Diferencial delta" foi o nome dado a porcentagem de votos a serem transferidos.

Respaldado na apuração paralela da Rádio JB e também na sua própria experiência eleitoral, Miro Teixeira (PMDB), no dia 18 de novembro, deu entrevista reconhecendo a vitória de Brizola. Em seguida, Moreira Franco, procurado pelo advogado do PDT, Wilson Mirza, concordou em enviar um telegrama a Brizola cumprimentando-o pela vitória.

De posse do telegrama, no dia 19, Brizola concedeu uma entrevista voltada principalmente para jornalistas estrangeiros, na qual se proclamou o vitorioso da eleição, independentemente de os resultados divulgados pelo TRE/Proconsult.  "Só a fraude nos tira a vitória", bradou. Seu alerta repercutiu mundialmente e logo recebeu saudações de personalidades internacionais, como o chanceler socialista da Alemanha, Helmut Schmidt

Veja aqui uma notícia do Jornal do Brasil da época: (http://news.google.com/newspapers?id=s_8jAAAAIBAJ&sjid=68wEAAAAIBAJ&hl=pt-BR&pg=6788%2C4618650).

Foi assim que Leonel Brizola venceu Moreira Franco na primeira eleição direta para governador, após 18 anos de ditadura militar no Brasil. Assim desmoronou o esquema da fraude, inclusive com a Rede Globo acenando uma bandeira branca ao abrir espaço para uma entrevista do candidato pedetista. Brizola, porém, impôs condições: falaria ao vivo, sem direito a cortes ou edições. O que de fato aconteceu.

Esta foi a primeira experiência brasileira com a apuração eletrônica. Como as urnas ainda eram as tradicionais urnas de lona, a apuração de cada urna era manual. Por isso foi possível fazer uma transmissão e apuração paralelas dos votos. Esta verificação evidenciou a grande fraude.

O TRE disse que errou na publicação dos Boletins de Urna! Disse também que iria refazer o software! Não errou, a fraude foi descoberta e comprovada. A propaganda oficial da época dizia que a falcatrua teria sido feita pelas juntas apuradoras das eleições e divulgaram várias estórias para convencer o povo. Isto é desatino, absurdo! Fraudes das juntas apuradoras ou mesmo dos eleitores não explicariam a diferença entre os resultados das totalizações paralelas e a apuração informatizada do TRE.

No entanto, o embuste não terminou! Ao contrário, nas eleições seguintes ele se expandiu e tornou-se mais hermético. 

Em 1986, a Justiça Eleitoral promoveu o recadastramento geral do eleitorado brasileiro, como sempre, sem a devida fiscalização por parte do eleitorado. Além disso, iniciou o processo de informatização da totalização dos resultados eleitorais em todo o país.

O voto do eleitor foi extinto, a urna foi substituída por computadores, os quais passaram a imprimir os resultados de cada “urna eletrônica”, os quais são enviados para o TSE para a totalização geral. 

Hoje, o registro do voto não pode ser conferido nem mesmo pelo próprio eleitor, o autor do voto, porque o voto real não existe mais. Agora o voto é imaginário, virtual. A contagem é feita por software e não é possível fiscalizá-la, como também não é possível fiscalizar a totalização geral. Quem, de fato, conta os votos remotamente é quem fez o software! Este ou estes são conhecidos? 

Atualmente o processo está completamente automatizado. Não existe mais a possibilidade de se fazer prova de fraude. Portanto, é preciso que o povo tenha fé no processo. É por isso que, no Brasil, se faz uma descomunal propaganda das urnas eletrônicas brasileiras.

A celeridade do processo de apuração dos votos no país tem sido o aspecto mais destacado pela mídia e pela Justiça Eleitoral. Contudo, os especialistas que se dedicam à análise da segurança do voto eletrônico e do processo de fiscalização de todas as etapas da votação, da apuração até a totalização dos votos, chamam a atenção para o fato de serem impossíveis tanto a fiscalização da contagem dos votos como a auditoria por parte dos partidos políticos, Ministério Público e organizações da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil, entidades mencionadas na Lei 9.504/97 como partícipes ativos da fiscalização das eleições.

De fato, cabe perguntar:

1) por que outros países, reconhecidamente mais capacitados técnica e financeiramente, ainda não implantaram o voto eletrônico de forma total e completa?";

2) "por que, além de propiciar uma apuração mais rápida, o TSE não implantou o mais importante: uma apuração eleitoral que pudesse ser conferida pela sociedade civil?

 

A resposta à primeira pergunta é óbvia:  simplesmente porque qualquer apuração eleitoral não deve ser secreta.

A confiabilidade do processo eleitoral é muito mais importante que a velocidade da apuração eleitoral.

 
Almir Quites

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